Victor Giudice foi durante toda a vida um músico amador. Amador no sentido empregado por Antonin Artaud: aquele que produz porque ama ou sente dor. Seu envolvimento apaixonado com a música ditava-lhe as preferências artísticas, o comportamento e a sua própria visão de mundo. As formas perfeitas, para ele, teriam obrigatoriamente o ritmo, a progressão e a emoção de uma sinfonia, uma sonata etc.
Suas memórias mais remotas relacionavam-se com os concertos assistidos na infância - ou o encantamento com a trilha sonora dos filmes e seriados, como se vê no texto autobiográfico que ele produziu para um curso sobre música sinfônica. A nostálgica canção Paese mio, entoada no filme Rocco e seus irmãos, de Luchino Visconti, levava-o facilmente às lágrimas.
Quando adolescente, freqüentou o programa de calouros de Ary Barroso na televisão, ganhando notas máximas para sua dublagem da melodramática interpretação de Al Jolson na canção My Mammy, ou a performance ao piano na Canção da pulga, de Mussorgsky. Da primeira vez, ele foi porque os amigos duvidaram. Da segunda, porque Ary Barroso pediu insistentemente. Só a necessidade precoce de ajudar no sustento da família o impediu de perseverar na carreira de músico.
Sua memória prodigiosa armazenava partituras inteiras de sinfonias e óperas, que ele era capaz de reger em saraus domésticos. Além disso, tinha uma voz de tenor nada desprezível.
De percepção eminentemente sinestésica, Giudice via imagens na música e música nas imagens. As influências da ópera no cinema foram uma de suas fixações temáticas (veja trecho de ensaio sobre o assunto, publicado na Folha de São Paulo). Esta característica iria mesmo refletir-se na sua escrita, o que não passou despercebido, por exemplo, ao poeta, escritor e crítico literário Gastão de Holanda, que viu no conto A lei do silêncio uma paráfrase do Mikrokosmos, estudos para piano de Béla Bartók.